segunda-feira, 6 de junho de 2016

É DO(A)S CARECAS QUE ELA(E)S GOSTAM MAIS

A cabeça está nua, o rosto à mostra, o sorriso totalmente devassado. A falta de cabelo pode dar até dor de cabeça, mas pode também proporcionar um ar andrógino e ao mesmo tempo divino. Por isso, vez por outra, carecas ganham na Avenida uma roupagem artística e performática, garantindo aplausos e, em alguns casos, um sucesso arrebatador.



Vamos voltar a 1976, ano em que a Mocidade Independente de Padre Miguel apresentou o enredo “Mãe Menininha do Gantois”. Antes de cunhar a inesquecível imagem da bateria da Mocidade Independente de cabeça raspada, houve muita polêmica. O pedido para que os ritmistas desfilassem sem os cabelos partiu da própria homenageada, Mãe Menininha. E foi feito diretamente a representantes da verde e branca da Padre Miguel.

A jornalista Bárbara Pereira, autora do livro Estrela que me Faz Sonhar, explica: “os integrantes da bateria deveriam estar vestidos como ogãs dos terreiros, e, portanto, suas cabeças seriam raspadas e os cabelos, entregues para a própria Mãe Menininha, em Salvador (...). As cabeças foram raspadas, a contragosto dos ritmistas, mas o incumbido de levar os cabelos até a Bahia, Jorginho Bracinho, sofreu um acidente durante a viagem”.


Em 2001, com o enredo “Paz e Harmonia, Mocidade é Alegria”, Renato Lage decidiu revisitar Arlindo e “encarecar” de novo a bateria da escola, desta vez homenageando o líder pacifista hindu Mahatma Ghandi. Houve resistência, mas os ritmistas acabaram cedendo.

Se para o lado da rapaziada foi dureza pelar a cabeça, imagina para uma mulher. Mas foi aí que a magia se fez. Pinah, a mineira de Muriaé de 1,80m de altura e porte de totem africano, tornou-se o símbolo de beleza e personalidade ao encarar sem medo a avenida com a cabeça ornada apenas de pequenos adereços. Uma jornada que começou ainda em 1976, quando foi “descoberta” como modelo. “Em um dos seus primeiros trabalhos, posou com estamparias africanas para a artista plástica Iracy Carise, e pouco depois conheceu Luiz Carlos Ribeiro, costureiro para concursos em clubes”, conta o jornalista Aydano André Motta, no livro Maravilhosa e Soberana, sobre histórias e personalidades da Beija-Flor de Nilópolis.



Atualmente, a herdeira do espólio da beleza calva no imaginário carnavalesco é Jéssica Mara, modelo de 1,83m de altura. As performances da bela componente sobre os carros da Caprichosos de Pilares, e posteriormente, da Estácio de Sá, causaram um impacto da magnitude de um terremoto na Sapucaí. Sucesso absoluto.  



Mas impactante mesmo foi a imagem da porta-bandeira Squel Jorgea. Num ano em que Maria Bethânia foi a grande estrela do enredo campeão mangueirense, a jovem fez história ao mostrar-se com uma careca proeminente, lembrando as filhas de santo que raspam a cabeça em cerimônias religiosas. Tratava-se, na verdade, de um truque muito bem feito de maquiagem e pintura, utilizando uma touca que escondia a vasta cabeleira. Arte pura surgida da cabeça do marido e carnavalesco Leandro Vieira, que enxergou como seria notável apresentar uma porta-bandeira careca. E assim o foi.



Recurso que também havia sido utilizado por Joãosinho Trinta em 1996, no enredo “Aquarela do Brasil, Ano 2000”. Naquele ano, o carnavalesco maranhense pediu que fosse raspada (mesmo!) a cabeça da segunda porta-bandeira Simone, que representaria uma filha de santo. Houve burburinho, e a imagem, mesmo não tendo tanta força como a que a Estação Primeira cunhou neste ano de 2016, ficou eternizada.



Esses exemplos mostram que no carnaval soluções ousadas e radicais, quando bem realizadas, são sucesso garantido na Avenida. Para o bem do espetáculo, na hora do aperto, os diferentes são os maiorais. Afinal, é deles, dos destemidos, que o povo gosta mais.





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